Saturday, October 18, 2008

Hold Me Tight, Let Me Go de Kim Longinotto

Não há entrevistas directas, nem juízos, nem partidos, há apenas uma câmara a filmar o que se passa. Somos convidados a interpretar as imagens como quisermos, a darmos-lhes o sentido que bem entendermos. O papel do realizador aqui foi apenas dar-nos a conhecer episódios de algumas vidas que de outro modo não teríamos acesso. Vê-se com um aperto no estômago e um nó na garganta do princípio ao fim. Muitas vezes, através de um olhar embaciado. No final, uma rapariga de um grupo de adolescentes soluçava no ombro da senhora que os acompanhava (talvez uma professora). O filme mereceu-o. Era imensamente perturbador.

Hold Me Tight, Let Me Go mostra o dia a dia das 40 crianças que vivem na Mulberry Bush School, em Oxfordshire, Inglaterra. É uma escola de fim de linha, para onde as crianças vão quando não há espaço para elas noutro lado. Vêm de famílias disfuncionais, muitos sofreram traumas emocionais graves e foram repetidamente expulsas de várias escolas devido ao seu comportamento. O trabalho dos 108 funcionários é dar-lhes ferramentas que lhes permitam integrar-se de novo nas famílias ou numa escola aberta. Não é um trabalho fácil.

O filme foca-se sobretudo em cinco rapazes: Alex, Ben, Robert, Charlie e Mike; se bem me lembro, todos com 8 anos, à excepção de Mike, com 12. Quase nenhum tem contacto com o pai; a mãe de Alex não sabe bem onde está o pai dele, a de Ben esfaqueou-o, Charlie descobre que o pai morreu durante o curso do documentário, o de Mike não é mencionado e o de Robert admite que não gosta muito deste filho. As mães foram-no provavelmente demasiado cedo e alternam entre o extremoso quando eles estão calmos, com o "tirem-me deste filme", quando eles têm um ataque de fúria ou começam a ficar mais agitados.

A certa altura, alguém diz no filme que por muito mal que os pais os tratem, todos estes miúdos procuram a sua atenção e querem ser aceites por eles. A aceitação dos pais define-os. A rejeição deixa-os à deriva. Por isso, os mesmos miúdos que vemos completamente descontrolados em algumas cenas, a pontapear, insultar e cuspir em que qualquer pessoa que esteja à frente, transformam-se em pequenos anjos nos dias de visitas dos pais. É um equilíbrio instável e periclitante, que se pode desfazer de um momento para o outro, o que está muito bem resumido no título do filme. A ideia é que o tempo que passam nesta escola (cerca de três anos, no máximo, creio eu) lhes permita controlar melhor a fúria que os consome e que, de algum modo, se possam reconstruir com uma imagem mais positiva deles próprios.

Creio que seria positivo que os pais deles fossem também a uma escola durante o tempo que as crianças estão lá, porque é verdadeiramente difícil lidar com crianças tão zangadas. Será, com certeza, necessário muito treino e auto-controle para não perder a calma; os adultos da escola estão treinados para agarrar as crianças até que elas se acalmem e creio que nenhum deles levantou a voz em algum momento do filme.

Em pelo menos dois momentos do filme, há miúdos que falam em matar pessoas ("um dia, vou-te matar" ou, numa brincadeira, "estávamos no MacDonalds a matar pessoas"). Interrogo-me sobre o que acontecerá às crianças depois de sairem dali, sobre o que lhes reserva o seu futuro. A sua instabilidade emocional causa-lhes grandes problemas de aprendizagem. Não são pouco inteligentes, nada disso, mas têm uma capacidade de concentração muito reduzida. Além disso, não sei se as famílias lhes conseguem dar a estabilidade que eles precisam, a sensação de que têm alguém todos os dias, que gosta deles e lhes dá atenção devida, mesmo sem eles terem que partir nada. Por último, não consigo deixar de pensar que, se ali estão 40, onde estarão todos os outros?

Foi o nosso primeiro filme do DOC 2008 e acho que começou com chave de ouro.

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